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PRETOS-VELHOS: A ALMA DA UMBANDA

Foto do escritor: Luiz de MirandaLuiz de Miranda

Atualizado: 4 de mai. de 2023


(Luiz de Miranda – Pai no Santo)

Se a Umbanda pudesse ser definida em uma única Linha de Trabalho, certamente seria a Linha dos Pretos Velhos. Essas Entidades trazem consigo todos os fundamentos que alicerçam os pilares da Umbanda. Desde a travessia do Atlântico, até os dias atuais, são exemplos notáveis de fé, sabedoria e resistência. Trouxeram para o Brasil uma vasta cultura, que se estende pelas artes, culinária, religiosidade, cultivo e plantações, medicamentos naturais capazes de curar doenças, arquitetura e literatura.

É importante sempre ressaltar que os negros trazidos da África não eram escravos, e sim, escravizados, e que nunca aceitaram essa maldita condição imposta pelos colonizadores europeus, aqui no Brasil.

Falar de Preto Velho é falar de resistência, fé e coragem. Homens e mulheres que debruçados sobre suas dores, buscavam formas e maneiras de libertarem seu povo dos terríveis algozes. Uma luta que perdura até os dias de hoje, no que diz respeito a igualdade e equidade das raças, gênero e condições sociais.

Preto Velho é paciente, mas nunca acomodado, é tolerante, mas nunca permissivo, é bondoso, mas nunca ingênuo, é resignado, mas nunca conformado.

Preto Velho é a ancestralidade do povo brasileiro. Homens e mulheres de pele preta que derramaram seu sangue para libertar brancos, negros e indígenas de toda opressão. Preto Velho lutou e continua lutando por todos os marginalizados, por todos aqueles e aquelas que são desprezados, esquecidos e oprimidos pelo sistema colonialista da supremacia branca.

Sentar-se à frente de um Preto ou de uma Preta Velha, é ter a certeza que será acolhido por um espírito que sabe bem onde dói a ferida.

Geralmente, essas Entidades se vestem com roupas em xadrez preto e branco. Tal costume tem várias explicações, dentre elas: determinados escravos só podiam se vestir de branco ou xadrez preto e branco/ O uso era um protesto contra a segregação racial/ O equilíbrio entre a luz e a ausência dela/ o fim de uma existência e início de uma outra.

O seu cachimbo além de ser um meio de espargir energias negativas através da fumaça (mundo celestial), simboliza também o sagrado feminino (depositário das ervas) e o masculino (tubo de fumaça) e ainda o mundo terrestre (ervas).

Suas rezas e benzimentos tem grande poder de cura e alívio para as dores e doenças do corpo e da alma.

Uma palavra dita por um Preto Velho nunca deverá ser esquecida, pois nela está contida os fundamentos da sabedoria ancestral.

As primeiras incorporações de Pretos Velhos, deu-se no século XIX, em Terreiros de Macumba do Rio de Janeiro, e ainda, de acordo com alguns historiadores, no século XVIII em Terreiros de Calundu, em Minas Gerais, através de Luzia Pinta, médium que foi denunciada ao Santo Ofício no ano de 1739 como feiticeira e enviada a Portugal no ano de 1742 para ser julgada pelo Tribunal de Inquisição de Lisboa, onde permaneceu encarcerada no calabouço do “Santo Ofício” durante dois anos, sem que se saiba qual o seu destino.

“Branco quem disse que Preto Velho não sabe ler. Preto Velho pegou na pemba, escreveu pra branco ler.” Esse é um trecho de um dos pontos mais enigmáticos da falange dos Preto Velhos, nele está contida toda uma sabedoria que vai além da escrita formal, sinais que remetem ao mundo espiritual e que são desconhecidos pela maioria das pessoas. Chamados de pontos riscados, garantem ao ambiente e as pessoas que nele estão, bênçãos de proteção e segurança, invocando forças espirituais para garantirem o êxito dos trabalhos ali realizados.

Estar diante de um Preto Velho é a oportunidade de agradecer por todas as grandes conquistas sociais e políticas, das quais hoje todos usufruem.

Preto Velho é de fala mansa, mas não é manso, é humilde, mas não subserviente, é pacífico, mas não passivo. Preto Velho sempre sabe o que diz, e diz o que é preciso ser dito. Ele ensina a esperar a colheita do que se plantou, mas nunca descansar diante da plantação, pois só assim, é capaz de impedir que todo seu trabalho seja destruído por ervas daninhas.

Preto Velho é sábio e quer que todos os homens e mulheres de bom coração desfrutem do dom da sabedoria.

Adorei as Almas!

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Patricia Martiliano
Patricia Martiliano
May 13, 2024
Rated 5 out of 5 stars.

Adorei as almas. Que nunca nos falte um colo de preto velho para chora e uma 🤍🖤

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SUA FÉ É RESPEITADA?

          No ano de 1990, meses antes de perder sua irmã de 29 anos de idade para um adenocarcinoma no mediastino, o Pai no Santo passa por uma experiência extremamente desagradável e revoltante, que bem retrata o racismo religioso no Brasil. Isso aconteceu no Iaserj, um hospital para os servidores do Estado do Rio de Janeiro. Era por volta das dezesseis horas. Enquanto acompanhante da irmã, ele decide ir tomar café num bar próximo ao hospital e retorna vinte minutos depois. Tempo que foi suficiente para um pastor entrar no quarto e oferecer uma oração. Voltando então do seu café, ele encontra a irmã que já vinha extremamente debilitada por conta da doença, agora, com semblante ainda mais triste e constrangido. Ele então procura levar palavras de consolo e ânimo, ao que ela responde: “_ Meu irmão, por favor, não quero que esse tipo de religioso venha fazer oração pra mim.” Ele de imediato, pergunta:  “_ O que houve?” Ela então relata o ocorrido: “_ Quando você saiu para tomar seu café, um homem de terno se apresentou como pastor da igreja universal e me perguntou se podia fazer uma oração pra mim, Como ele parecia ser uma boa pessoa e foi muito educado, eu disse que sim. Ele fez a oração, pediu pela minha saúde, e em seguida me perguntou se eu aceitava Jesus Cristo como salvador, e eu respondi que sim. Ele então disse que a partir daquele momento eu estava curada. Só que ele então perguntou qual era minha religião, o que eu respondi, que era espírita. Então ele me disse que eu teria que renegar minha religião. Eu disse que não, jamais iria renegar minha fé. Daí ele falou que infelizmente o câncer voltaria e me levaria pros braços da morte. Eu disse a ele que preferia morrer, a ter que conviver com cristãos como ele. Não quero irmão, não quero esse tipo de gente fazendo oração pra mim.”

            Em outra ocasião, anos depois, o racismo e a intolerância religiosa voltam a atacar o Pai no Santo. Dessa vez, no Hospital Regional Darci Vargas, em Rio Bonito. Indo visitar um Filho de Santo na Unidade Intensiva, o Pai no Santo se depara com uma senhora que estava ao lado do leito de seu filho perguntando se podia fazer uma oração. Como o doente estava sob efeito de fortes medicamentos, não tinha condições de responder; o que fez com que a mulher iniciasse a sua oração. Em voz alta e de tom feroz, ela dizia: “ _ Em nome do Senhor Jesus eu expulso os demônios de Pombagira, Exu, Ogum e todos os demônios dos tambores, das encruzilhadas... .” quando então foi interrompida pelo Pai de Santo; gerando na mulher um comportamento agressivo e ameaçador. Dizia ela, agora em tom mais elevado de voz: “_ Você não pode querer calar a voz de uma ministra de Deus. Seus demônios serão jogados por terra... .” quando então o Pai no Santo pediu ao funcionário responsável pela vigilância da Unidade, que retirasse a mulher do ambiente. No que foi prontamente atendido.

            Esses são dois exemplos dos milhares de outros que acontecem todos os dias, atingindo seguidores das religiões de matriz afro-brasileira. E não é à toa, afinal, não faltam umbandistas que se silenciam diante de tais fatos, e como se não bastasse o silêncio, ainda permitem que seguidores de outras religiões lhes imponham sua fé como sendo superior as demais.

            O Umbandista de fato, sabe sua origem, conhece seus Santos, suas rezas, seus cantos e louvores. Não é de hoje que a Umbanda se livrou do peso do sincretismo, dos santos que nunca foram seus, dos ritos e rituais que nunca lhes pertenceram. O Umbandista de fato, sabe a quem recorrer nas horas de aflição e desespero, e não precisa que outro religioso venha em seu socorro para rezar ou orar. Sim, não precisa! Sabe por quê? Porque o Umbandista sabe que aquela pessoa não está oferecendo uma oração para aliviar teu sofrimento. De forma dissimulada, ela quer que o Umbandista negue sua religiosidade, abandone seus Guias e Orixás. Como pode uma pessoa que frequentemente está na igreja ouvindo e dando glórias a voz de um padre ou pastor, e que não mede palavras para demonizar a Umbanda, orar por quem é Umbandista? De que vale uma oração que sai da mesma boca que chama nossos Santos de demônios?

            O Umbandista de fato, sabe o poder de seus Santos, o sangue que derramaram, o suor sofrido e causticante ardendo na pele preta, o fogo impiedoso das fogueiras da inquisição, a lâmina cortante e afiada das guilhotinas. O Umbandista de fato, sabe que seus ancestrais e antepassados morreram para garantir a liberdade aos seus  descendentes. Trazidos à força e amontoados nos navios negreiros, chegam ao Brasil e são obrigados a se batizarem do lado de fora das Igrejas, porque de acordo com as interpretações bíblicas, o preto era um ser sem alma, amaldiçoado...

            Quando um Umbandista respeita outras manifestações religiosas, não quer dizer que ele tenha que se subjugar. Os Santos da Umbanda também têm suas histórias, sua cultura, suas bênçãos e seus poderes.

            Seu Orixá está vivo e pulsante em você. Não deixe que o matem!

                                                                                                   (Luiz de Miranda-Pai no Santo)

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