Enquanto umbandistas, precisamos entender que é muito importante conhecer a origem de tudo aquilo que praticamos em nossos Terreiros, considerando que muitos dos ritos e rituais praticados, são de origem Yorubá ou nagô, a primeira, é a região do continente africano localizada no sudoeste da Nigéria e sul do Benin, de onde vieram os negros escravizados para o Brasil no final do século XVIII e início do século XIX. Já a segunda, chega ao Brasil muito antes dos yorubas, entre os anos de 1580 e 1850, trazidos forçosamente da África Central, onde hoje se conhece como Angola, Congo, Cabinda, Moçambique.
Neste texto falaremos sobre a noz-de-cola, que na língua bantu é chamada de kezu ou makezu, e em Yorubá, chamado de obi.
O obi de quatro gomos é chamado de Àbàtà, muito usado nas oferendas, amacis e para confirmação de obrigações de cabeça. Existem ainda os de duas, três e até cinco partes. Mas, os mais comuns são o Àbàtà e o de duas partes. Esse último usado somente para oferendas e amacis; pois não tem o axé necessário para confirmar as obrigações de cabeça. Lembrando aqui, que não se pode por hipótese alguma usar faca ou qualquer objeto de metal para abrir um obi. No entanto, depois da semente ter dado a alafia (confirmação), aí sim, pode se usar uma faca para cortar em fatias e distribuir aos que foram convidados para assistir o ritual de confirmação.
Roxo e branco são as cores e espécies de obi mais conhecidas aqui no Brasil. O obi branco é considerado em algumas vertentes de Umbanda, como um fruto que ainda não está maduro o suficiente para ser usado em rituais de confirmação, ficando seu uso para as oferendas mais simples e também para lavar e acalmar a cabeça do filho que se encontra agitado. Diferente do roxo, que já está preparado e com todo axé para confirmação de obrigações.
Importante saber que em nenhuma oferenda, obrigação ou confirmação de um filho de Xangô, se usa obi. Tal procedimento se deve ao respeito de um itan (lenda), que diz que o Rei de Oyó teria se enforcado num pé de obi, por conta de uma grave crise no seu reino, envolvendo traição, corrupção, mentiras e injustiças. E nesses casos, àquela época, era sempre o rei apontado como culpado, e por isso deveria tirar a própria vida, em respeito aos seus súditos. No entanto, há os que defendem que Xangô não se matou, e sim, se imortalizou, livrando seu povo do mal que se abatia sobre ele. “Morrer esquecido é morrer de fato e Xangô decretou que nem a morte poderia arrancá-lo da vida. Provou que seu poder era maior que qualquer coisa, pois mais absoluto que o poder de Xangô só existia o de Iku (a morte), o único que igualava vis mortais a grandes reis (...) Xangô decide sobre a vida de todos, mas sobre a sua vida (e a sua morte) só ele tem o direito de decidir. Ele é mais poderoso que a morte, razão pela qual passou a ser o seu anti-símbolo. (trecho retirado do livro A Panela do Segredo de Pai Cido de Òsun Eyn)
O obi deve ser tratado com muito carinho e respeito, pois é uma semente aceita por todos os Orixás (exceto Xangô, que aceita o orobô). O obi é como um animal de duas ou quatro patas, que será sacrificado (tornado sagrado) para trazer as bênçãos do orun (céu) e as graças do ayê (Terra). Quem respeita e cuida bem do obi, será sempre visto com bons olhos por nosso amado Zambi e assistido por nossos Orixás. Obi é a força e ânimo que precisamos para o cumprimento de nossos deveres neste Terra, é o sustento da nossa fé, a disposição para seguir em frente, é o poder do Céu manifestado na Terra. Obi veio pelas mãos de Olodumare, Zambi, Deus.
A seguir, a história do nascimento do Obi:
“ “Olodùnmarè chama os homens para retornarem ao seu lar, porém nem mesmo a morte é capaz de apagar as lembranças dos feitos de grandes homens” era o nome do Babalawò que consultou Ifá sobre o surgimento de Obì no céu e na terra. Assim foi como Òrúnmilà revelou como Obì foi criada. Quando Olodùnmarè descobriu que as divindades estavam lutando umas contra as outras, antes de ficar claro que Èsù era o responsável por isso, Ele decidiu convidar as quatro divindades mais moderadas (Paz, Prosperidade, Concórdia e Aiye), para entrarem em acordo sobre a situação. Eles deliberaram longamente sobre o motivo de os mais jovens, não mais respeitarem os mais velhos, como ordenado pelo Deus Supremo. Todos começaram então a rezar pelo retorno da unanimidade e equilíbrio. Enquanto estavam rezando pela restauração da harmonia, Olodùnmarè abriu e fechou sua mão direita apanhando o ar. Em seguida abriu e fechou sua mão esquerda, de novo apanhando o ar. Após isso, Ele foi para fora, mantendo suas mãos fechadas e plantou o conteúdo das duas mãos no chão. Suas mãos haviam apanhado no ar as orações e ele as plantou. No dia seguinte, uma árvore havia crescido no lugar onde Deus havia plantado as orações que Ele havia plantado no ar. Ela rapidamente cresceu, floresceu e deu frutos. Quando as frutas amadureceram para colheita, começaram a cair no solo. Aiye pegou-as e as levou para Olodùnmarè, e Ele disse a ela para que fosse e preparasse as frutas do jeito que mais lhe agradasse. Primeiro, ela tostou as frutas, e elas mudaram sua textura, o que as deixou com gosto ruim. No outro dia, Ela pegou mais frutas e as cozinhou, e elas mudaram de cor e não podiam ser comidas. Enquanto isso, outros foram fazendo tentativas, no entanto todas foram mal sucedidas. Foram então até Olodùnmarè para dizer que a missão de descobrir como preparar as nozes era impossível. Quando ninguém mais sabia o que fazer, Elenini, a divindade do Obstáculo, se apresentou como voluntária para guardar as frutas. Todas as frutas colhidas foram então dadas a Ela. Elenini então partiu as cápsulas, limpou e lavou as nozes e as guardou com as folhas para que ficassem frescas por catorze dias. Depois, ela começou a comer as nozes cruas. Ela esperou mais catorze dias e depois disso percebeu que as nozes estavam vigorosas e frescas. Após isso, ela levou as frutas para Olodùnmarè e disse a todos que o produto das preces, Obì, podia ser ingerido cru sem nenhum perigo. Deus então decretou que, já que tinha sido Elenini, a divindade do Obstáculo, a mais velha divindade em sua casa quem conseguiu decodificar o segredo do fruto das orações, as nozes deveriam ser dali por diante, não somente um alimento do céu, mas também, onde fossem apresentadas, deveriam ser sempre oferecidas primeiro ao mais velho sentado no meio do grupo, e seu consumo deveria ser sempre precedido por preces. Olodùnmarè também proclamou que, como um símbolo de Orações, a árvore somente cresceria em locais onde as pessoas respeitassem os mais velhos. Naquela reunião do Conselho Divino, a primeira noz de cola foi partida pelo próprio Olodùnmarè e tinha dois gomos. Ele pegou uma e deu a outra para Elenini, a mais antiga divindade presente. A próxima noz de cola tinha três gomos, os quais representavam as três divindades (Paz, Prosperidade e Concórdia) que fizeram as Orações que fez a árvore da noz de cola crescer. A seguinte possuía quatro gomos que representava Òrìsànlá, Aiye, Òrúnmilà e Èsù. A seguinte possuía cinco gomos que representava Òduduwá, Ògún, Òsonyin, Obalúwaiyè e Òsun. A seguinte possuía seis gomos representando a harmonia, o desejo das orações divinas, que se juntou as outras cinco divindades anteriores. A noz de cola com seis gomos foi então dividida e distribuída entre todos no Conselho. Aiye então fez nascer de si a noz de cola para os seres humanos, onde sua presença é marcada por orações e ela só germina e floresce em comunidades humanas onde existe respeito pelos mais velhos, pelos ancestrais e onde a tradição é glorificada.” (Texto extraído do site: file:///C:/Users/Windows/Downloads/Jogo_de_Obi_Um_dos_Grandes_Oraculos.pdf)