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A UMBANDA E O CARNAVAL

Ala das Baianas na Escola de Samba

Na proximidade do carnaval, começam as especulações sobre a presença de umbandistas nos dias de festejo, como também sobre o uso dos nomes dos Orixás nos sambas-enredos. Alguns Terreiros preferem organizar retiros, para evitar que seus médiuns participem da festa da carne, alegando ser um período muito perigoso, com forte influência de espíritos trevosos e obsessores. Há inclusive, Terreiros que após o carnaval, obedecem aos ritos da quaresma, fechando suas portas pelo período de quarenta dias. Vê-se nesses casos, a forte influência da doutrina católica no comportamento religioso de Pais e Mães de Santo, que preferem manter tal doutrina, como base para os seus rituais afro-brasileiros. No entanto, é preciso buscar um maior entendimento sobre esses comportamentos, como por exemplo: até quando vamos obedecer a dogmas que nada tem a ver com a nossa crença? Por qual razão ou motivo, temos que fechar nossos Terreiros por quarenta dias, em respeito a algo que não faz parte das histórias de nossos Guias e Orixás? O que nos leva a fazer jejum para uma religião que persegue e sempre perseguiu nossos ancestrais e antepassados?

Veja bem: não estou aqui, faltando com respeito a Igreja católica, estou apenas questionando um comportamento católico dentro da Umbanda. Sabemos que no passado, muitos Terreiros fechavam suas portas na Quaresma por medo da repressão policial; pois a Umbanda não era considerada religião, tanto que, muitos Pais e Mães de Santo da Umbanda e do Candomblé, se diziam católicos e seguidores das seitas afro-brasileiras. A Umbanda só é considerada religião em 15 de novembro de 1908, quando foi institucionalizada pelo Caboclo das Sete Encruzilhadas, no médium Zélio Fernandino de Moraes. Lembrando, que no Brasil, só com a constituição de 1988, que foi assegurado o direito de culto à todas as religiões. Natural, portanto, que sacerdotes da Umbanda, a fim de evitarem enfrentamentos com a Polícia e a Igreja Católica, mantinham seus Terreiros fechados no período da quaresma.

           Sempre bom lembrar que a Umbanda é uma religião plural, onde cada Sacerdote responde pelos seus atos, aos seus Guias e Orixás. Como é sempre dito: sua Casa, suas leis.

       Nenhum problema de um Filho de Santo brincar o carnaval, desde que evite excessos e faça as firmezas devidas para seu Exu e Pombagira. Cada Casa, terá seu ritual no sentido de garantir proteção e segurança para seus médiuns.

           Um Filho de Santo deve saber de suas responsabilidades enquanto um mediador entre o mundo espiritual e material. Um médium pode se divertir, desde que, obviamente, entenda que precisa manter seu equilíbrio psico-espiritual, a fim de evitar ataques de espíritos obsessores e acúmulo de energias pesadas. Divertir-se não é destruir-se. Todos têm direito a se divertir. Afinal, carnaval é uma festa linda, que além de gerar muitos empregos, gera também muitas emoções e encontros. Quantas pessoas aguardam ansiosas por esses dias de folia para vestirem suas fantasias, desfilarem em Blocos e Escolas de Samba... e fazem tudo isso com muito amor e dedicação. E é sob esses sentimentos que muitos sambas enredos são compostos exaltando aos Orixás e a Cultura Negra. Nada de errado em apresentar nossos Orixás ao mundo em dias tão cheios de cores, emoções e histórias.

            É preciso lembrar que o samba nasce nas senzalas e posteriormente, dentro dos Terreiros de Umbanda e Candomblé. Logo, não é de se estranhar que os grandes sambas enredos façam homenagens aos Orixás, contando suas histórias (itans) e envolvendo a todos, indistintamente, num clima de comoção, admiração e adoração.                 As Alas das Baianas foram criadas e tornaram-se obrigatórias, em homenagem às Mães de Santo. E de acordo com o regulamento da LIESA (Liga das Escolas de Samba), devem conter no mínimo setenta componentes.

      Tudo isso é cultura, alegria, emoção, trabalho, história, resgate, dignidade, macumba... tudo isso é carnaval!

           Proteja-se: encha seu coração de alegria e gratidão. Acenda uma vela pra seu Exu. Vá para onde quiser e se sentir bem, na certeza de que onde existe um coração feliz e grato, mal nenhum faz morada.

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Patricia Martiliano
Patricia Martiliano
Feb 27
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SUA FÉ É RESPEITADA?

          No ano de 1990, meses antes de perder sua irmã de 29 anos de idade para um adenocarcinoma no mediastino, o Pai no Santo passa por uma experiência extremamente desagradável e revoltante, que bem retrata o racismo religioso no Brasil. Isso aconteceu no Iaserj, um hospital para os servidores do Estado do Rio de Janeiro. Era por volta das dezesseis horas. Enquanto acompanhante da irmã, ele decide ir tomar café num bar próximo ao hospital e retorna vinte minutos depois. Tempo que foi suficiente para um pastor entrar no quarto e oferecer uma oração. Voltando então do seu café, ele encontra a irmã que já vinha extremamente debilitada por conta da doença, agora, com semblante ainda mais triste e constrangido. Ele então procura levar palavras de consolo e ânimo, ao que ela responde: “_ Meu irmão, por favor, não quero que esse tipo de religioso venha fazer oração pra mim.” Ele de imediato, pergunta:  “_ O que houve?” Ela então relata o ocorrido: “_ Quando você saiu para tomar seu café, um homem de terno se apresentou como pastor da igreja universal e me perguntou se podia fazer uma oração pra mim, Como ele parecia ser uma boa pessoa e foi muito educado, eu disse que sim. Ele fez a oração, pediu pela minha saúde, e em seguida me perguntou se eu aceitava Jesus Cristo como salvador, e eu respondi que sim. Ele então disse que a partir daquele momento eu estava curada. Só que ele então perguntou qual era minha religião, o que eu respondi, que era espírita. Então ele me disse que eu teria que renegar minha religião. Eu disse que não, jamais iria renegar minha fé. Daí ele falou que infelizmente o câncer voltaria e me levaria pros braços da morte. Eu disse a ele que preferia morrer, a ter que conviver com cristãos como ele. Não quero irmão, não quero esse tipo de gente fazendo oração pra mim.”

            Em outra ocasião, anos depois, o racismo e a intolerância religiosa voltam a atacar o Pai no Santo. Dessa vez, no Hospital Regional Darci Vargas, em Rio Bonito. Indo visitar um Filho de Santo na Unidade Intensiva, o Pai no Santo se depara com uma senhora que estava ao lado do leito de seu filho perguntando se podia fazer uma oração. Como o doente estava sob efeito de fortes medicamentos, não tinha condições de responder; o que fez com que a mulher iniciasse a sua oração. Em voz alta e de tom feroz, ela dizia: “ _ Em nome do Senhor Jesus eu expulso os demônios de Pombagira, Exu, Ogum e todos os demônios dos tambores, das encruzilhadas... .” quando então foi interrompida pelo Pai de Santo; gerando na mulher um comportamento agressivo e ameaçador. Dizia ela, agora em tom mais elevado de voz: “_ Você não pode querer calar a voz de uma ministra de Deus. Seus demônios serão jogados por terra... .” quando então o Pai no Santo pediu ao funcionário responsável pela vigilância da Unidade, que retirasse a mulher do ambiente. No que foi prontamente atendido.

            Esses são dois exemplos dos milhares de outros que acontecem todos os dias, atingindo seguidores das religiões de matriz afro-brasileira. E não é à toa, afinal, não faltam umbandistas que se silenciam diante de tais fatos, e como se não bastasse o silêncio, ainda permitem que seguidores de outras religiões lhes imponham sua fé como sendo superior as demais.

            O Umbandista de fato, sabe sua origem, conhece seus Santos, suas rezas, seus cantos e louvores. Não é de hoje que a Umbanda se livrou do peso do sincretismo, dos santos que nunca foram seus, dos ritos e rituais que nunca lhes pertenceram. O Umbandista de fato, sabe a quem recorrer nas horas de aflição e desespero, e não precisa que outro religioso venha em seu socorro para rezar ou orar. Sim, não precisa! Sabe por quê? Porque o Umbandista sabe que aquela pessoa não está oferecendo uma oração para aliviar teu sofrimento. De forma dissimulada, ela quer que o Umbandista negue sua religiosidade, abandone seus Guias e Orixás. Como pode uma pessoa que frequentemente está na igreja ouvindo e dando glórias a voz de um padre ou pastor, e que não mede palavras para demonizar a Umbanda, orar por quem é Umbandista? De que vale uma oração que sai da mesma boca que chama nossos Santos de demônios?

            O Umbandista de fato, sabe o poder de seus Santos, o sangue que derramaram, o suor sofrido e causticante ardendo na pele preta, o fogo impiedoso das fogueiras da inquisição, a lâmina cortante e afiada das guilhotinas. O Umbandista de fato, sabe que seus ancestrais e antepassados morreram para garantir a liberdade aos seus  descendentes. Trazidos à força e amontoados nos navios negreiros, chegam ao Brasil e são obrigados a se batizarem do lado de fora das Igrejas, porque de acordo com as interpretações bíblicas, o preto era um ser sem alma, amaldiçoado...

            Quando um Umbandista respeita outras manifestações religiosas, não quer dizer que ele tenha que se subjugar. Os Santos da Umbanda também têm suas histórias, sua cultura, suas bênçãos e seus poderes.

            Seu Orixá está vivo e pulsante em você. Não deixe que o matem!

                                                                                                   (Luiz de Miranda-Pai no Santo)

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